quinta-feira, 26 de novembro de 2015

O USO DA VOZ NA PREGAÇÃO



Uma palavra introdutória vem-nos de Alves Mendes, orador sacro português, que aqui se põe em destaque:
A oratória é a mais típica e a mais gráfica manifestação da arte, porque é a arte da palavra.
A palavra é a vestidura do pensamento, é a forma da ideia, é a nítida voz da natureza e do espírito, é tão leve como o ar e tão irisada como a mariposa, é transparente como a gaze e tão sonora como o bronze. A palavra cicia como a aura e troa como o canhão, murmura como o arroio e ruge como a tormenta, prende como o imã e fulmina como o raio, corta como a espada e contunde como a clava, fotografa como o sol e acadinha como o fogo, ostenta a majestade da arquitetura, o matiz da pintura, a melodia da música, o ritmo da poesia, e que por seus rendilhados e riquezas, por suas graças e opulências, aclama a oratória, rainha das artes, e o orador – rei dos artistas! (Citado por Polito. Adaptado).

A seguir, algumas considerações sobre o uso da voz, seus efeitos e suas consequências, tanto para o próprio orador como para seus ouvintes.

1. A voz é um elemento de suma importância para o pregador, como, de resto, para qualquer orador. É instrumento por excelência da comunicação.

2. Uma boa impostação da voz favorece à saúde vocal do orador bem como à saúde auditiva dos ouvintes. Quando agride, também se agride.

3. A maneira agradável de falar ou de usar a voz pode conquistar ou desvanecer os ouvintes.

4. “A oratória é a rainha das artes, e o orador – rei dos artistas” (Alves Mendes). Contudo, a glória do pregador está na majestada da pregação.

5. Uma velha assertiva diz: “Os poetas nascem, e os oradores se fazem”.

6. Ao falar em público, deve o orador preocupar-se com o uso da voz. Há dois elementos muito importantes nesta consideração: o volume, que está relacionado com a intensidade, leva o orador a forçar a voz; e a tonalidade, que está relacionada com o tom vocal que se usa – mais agudo ou mais grave. Quando o volume é mais intenso, a tonalidade se torna mais aguda. “Usar um grande volume de voz é perigoso e desgastante”, mormente se não houver habilidade ou treinamento para fazê-lo. Manter sempre a mesma intensidade vocal é desconfortável.

7. Diz-se que oradores com voz mais aguda ou com maior número de vibrações, como acontece com cantores, no caso, tenores e sopranos, são, por isto, mais interessantes – atraem mais a atenção dos ouvintes. São mais dramáticos. Tudo depende de como colocar a voz, da expressão que se lhe dê no calor da oração ou numa ênfase proposital, estando o orador aquecido ou tomado de legítima emoção. Nada artificial, por favor!

8. Hoje existem, a acudir os oradores frente a plateias numerosas ou grandes congregações, microfones de alta qualidade e tamanho cada vez menor. Isso ajuda o pregador ou orador, até em sua discrição. Seu uso, entretanto, pode favorecer ou compromoter o discurso. O uso incorreto ou inadequado de um microfone em muito prejudica a fala, produzindo incômoda reverberação no ambiente sem tratamento acústico e irritando os ouvidos.

9. Bons microfones existem, como os das marcas Shure (o mais usado), AKG, Electro voice, Leson, entre outros, muito sensíveis, e alguns que são específicos para instrumentos. Esse equipamento projeta a voz do orador e o poupa de desgaste e sério comprometimento de suas pregas vocais. Quando usamos um microfone, não precisamos usar mais de 50% do nosso volume vocal. Deve-se evitar intensidade vocal desnecessária.

10. Reinaldo Polito, em seu livro Como Falar, afirma que “a voz determina a personalidade de quem fala” (p. 56). Assim, nossa voz denuncia se estamos alegres, tristes, apressados, seguros etc. A voz identifica esses comportamentos ou estados de espírito. Qualquer problema de ordem física ou emocional será imediatamente revelado através da voz.

11. Alguns fatores ou elementos ligados à voz entram nessa consideração:
a) A respiração. Quem fala de forma ofegante, tropeça nas palavras. Uma fala “trepidante” não é muito agradável de se ouvir. É como gagueira... Respirar bem é o primeiro cuidado que se deve ter para que a voz adquira a qualidade desejada. A gesticulação deve ser coerente com o que o pregador está falando. É um importante acessório à palavra.

b) A dicção. Boa diccão, boa pronúncia dos sons das palavras. Não deve haver negligência neste particular. Nem todos os que estão numa congregação têm ouvidos educados ou percepção aguda para entender o que não se fala. As palavras são formadas por sílabas ou fonemas. Todos devem ser pronunciados. Eco não substitui pronúncia...

c) A velocidade. Um bom orador não age como um locutor esportivo. Boas ideias não dependem tanto da quantidade de palavras, mas de sua colocação adequada e sentido preciso. Dizer bem não é dizer muito. É dizer certo. A assimilação do que o orador diz depende de algum tempo para se pensar. Alguns ouvintes, menos; outros, mais. É bom lembrar-se de que uma fala rápida não oferece muito campo para deduções... Falar bem requer que se comuniquem ideias completas. Também para isto contribui um espírito estável. A velocidade da fala depende tanto do orador como do assunto que ele esteja expondo. Passa por sua capacidade de respiração, da emoção, da clareza da pronúncia e da mensagem transmitida, assevera Polito.

Vejamos estes exemplos:
1) Na frase: Passou rápido como a luz (fala mais rápida).
2) Na frase: Desceu lentamente como as sombras da noite (fala mais lenta).

d) A expressividade da fala. Há sílabas que são mais importantes dentro de uma palavra. O que é tônico, é tônico; não é átono. No primeiro caso há acentuação na sílaba tônica. No segundo, não. Há palavras oxítonas – sabiá; paroxítonas – sabia; e proparoxítonas – sábia. Se não se acentua bem a pronúncia, o sentido da palavra poderá ser outro.

e) A intensidade. Há de haver vigilância neste particular. Não faz sentido de uma palavra. O que é tônico, é tônico; não é átono. No primeiro caso há acentuação na sílaba tônica. No segundo, não. Há palavras oxítonas – sabiá; paroxítonas – sabia; e proparoxítonas – sábia. Se não se acentua bem a pronúncia, o sentido da palavra poderá ser outro. e nem é elegante falar aos “berros” a uma pequena congregação, nem aos sussurros para uma multidão. Ninguém impressiona, se diante de um pequeno grupo de pessoas, troveja (um trovão); ou soa alto como dobram os sinos, por sinal, vazios... “Se falarmos com voz defeituosa, a mensagem chegará distorcida aos nossos ouvintes” (Polito).

12. Algo que precisa ser bem tratado são as emoções do pregador ou orador. Deixar-se dominar pela ansiedade, seguramente compromete a qualidade do seu desempenho. A ansiedade não é um mal em si. É até sinal de normalidade... Mas, a depender do indivíduo, é evidência de insegurança, por falta de adequado preparo. O estilo de vida que hoje se vive nos grandes centros, as múltiplas atividades do pastoreio e a segurança do pregador, pela consciência tranquila de que se preparou de forma séria, ajudá-lo-ão de forma definitiva, quando se levantar para falar a uma congregação do Senhor. Calmo, sereno, seguro, maduro – ele sabe o que tem de fazer. Para esse momento ele se preparou, em oração, estudo, concentração e, ademais, sabendo ser adequada aos seus ouvintes a mensagem que lhes preparou. Feliz é o pregador que não se reprova naquilo que diz ao seu rebanho. “Bem-aventurado é aquele que não se condena naquilo que aprova” (Rm 14.22). O ideal é que como pregadores não sejamos nós mesmos reprovados naquilo que ensinamos.

Recife, 23.11.2013

Válter Sales


Fontes: POLITO, Reinaldo. Como Falar. São Paulo: Saraiva, 1991. 209 p.

             __________  Gestos & Postura para falar melhor. Ilustrado. São Paulo: Saraiva, 1993. 200 p.

             Artigo: “O esquecido microfone”, de Noélio Duarte (origem desconhecida)

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