Crescem juntos, no mesmo campo. Parecem irmãos, mas não
são da mesma semente. Joio é joio, trigo é trigo e, assim, demandam a vida
inteira (o joio não se faz trigo. Graças a Deus não nascemos joio!). Quem passa
e os contempla no campo, talvez os admire por sua harmonia e beleza; é que a estreita
semelhança confunde. Nem se dá conta de que eles são semelhantes só na
aparência. Iguais? Não. Em verdade são inimigos figadais. Joio é erva daninha,
cuja semente afeta os trigais. A verdade de cada um se manifestará pelos
frutos. Só na estação da colheita. Agora, ao homem não é dado fazer o corte...
O tempo próprio é o tempo de Deus. Qualquer antecipação será precipitada e
poderá trazer algumas consequências indesejáveis.
De aparente boa cepa é o joio visto por fora, pois cresce
como o trigo. Posa de trigo, vende a própria ilusão. Só não dá fruto de trigo
e, aí, vem à tona a fragilidade da falsa razão de si mesmo. O joio não resistirá
no juízo, pois só consegue afirmar-se perante uma consciência altiva. Mas,
quando se manifesta, ele faz estrago
grande porque confunde a verdade do trigo. Naturezas díspares não se coadunam.
Grotesca é a ilusão de ser sem ser. Não sendo verdadeiro, o joio vive apenas de
sua ostentação. Diga-se, por verdade: vida cristã não se nutre com
devaneiros...
Há quem, mesmo não sendo joio, ainda não é trigo maduro.
Também confunde, e não deve ser cortado. Há de haver paciência (discernimento e
paciência são perfeitamente análogos quando se quer uma averiguação séria). O
fruto não vem antes da estação própria, que o diga Davi no Salmo 1o.
Não se altera a lei natural sem se comprometer a qualidade do fruto.
Amadurecimento a carbureto não atende às exigências da natureza. É assim com a
evangélica.
Se é trigo, sê-lo-á em toda a fase de crescimento. Nesta
coerência há a promessa de boa produção. Assim, não causará ilusões, nem
desapontamento. Será verdadeiro o tempo todo. Vem de Leon Tolstoi, famoso escritor
russo, lúcida conclusão, em seu comentário a “O Reino de Deus está dentro de
vós”, incômoda, mas insofismável asserção: “Todos os homens do mundo moderno
vivem num contínuo e flagrante antagonismo entre sua consciência e sua maneira
de viver”.
Conquanto muito parecidos, o joio cresce como joio e o trigo
cresce como trigo. Transportada esta questão para a vida cristã – e é esse, precisamente,
o propósito de Jesus –, podemos compor-nos com Dallas Willard, ao confrontar a
vida com a palavra, o discurso religioso, quando pura retórica, intencional e autoafirmativo,
personalista e exclusivista, ensimesmado e autossuficiente. Diz esse autor,
pastor batista norte-americano, in O
Espírito das Disciplinas, pg. 28, aludindo à teologia na prática cristã diária:
“Teologia é um termo enfadônio, mas deveria ser um termo do nosso dia a dia. O
objetivo da teologia prática é tornar a teologia uma parte normal da vida.
Teologia é apenas um meio de pensar e entender, ou não entender, Deus. A
teologia prática estuda a maneira pela qual nossas ações interagem com Deus para
realizar os propósitos divinos na vida humana”.
Ainda, aduz Willard, “O fracasso humano consiste em
desejar o que é certo e importante, sem se dedicar ao tipo de vida que produz a
ação que sabemos ser correta e a condição que queremos experimentar” (p. 20). Certo,
na vida cristã, em última análise, é identificar nosso estilo de vida com o
estilo de vida do Cristo, nossos propósitos com os seus propósitos, nossos
caminhos e pensamentos com os seus caminhos e pensamentos. A estes Deus conhece
muito bem (Jr 29.11). É como
precaver-nos do desencontro com o Pai (Is 55.8).
Há de ser assim, em natural conformidade com Cristo,
aquela, altaneira, de que nos fala o Senhor, em João capítulo 15. Há de ser
assim, como no-lo ensina Davi, nesse monumental Salmo 1o – o
caminhar dos justos é natural, dá o seu fruto na estação própria. Nele, tudo é
obra do Criador. Em tudo prospera! É a obra perfeita, consumada, a que se
refere Salomão (Pv 4.18).
Bem haja quem assim o faça, na qualidade e na competência
de trigo do Criador. Em qualquer meio ou circunstância, dê frutos onde for
plantado.
Recife,
20.02.2015
Pr.
Válter Sales
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